O direito de propriedade é garantido constitucionalmente aos cidadãos brasileiros, por força do que dispõe o inciso XXII do art. 5º:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXII – é garantido o direito de propriedade;
Cláusula pétrea da CF/88, o direito de propriedade possui as características de ser absoluto, exclusivo, perpétuo e elástico.
Entretanto, o direito de propriedade sofre consideráveis limitações, dependendo, notadamente, o tipo de propriedade objeto do estudo. Um exemplo clássico de limitação à propriedade é o direito de vizinhança, que disciplina regras de convivência entre as pessoas e impede o uso nocivo do imóvel urbano.
Muito mais limitações possui, entretanto, o imóvel rural, em razão da sua relevância na produção de alimentos e riquezas. E certamente a limitação mais conhecida se refere à necessidade de cumprimento da função social a fim de impedir a desapropriação para fins de reforma agrária. Veja o que diz o art. 184 da CF:
Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.
Embora sempre ouvimos falar em função social e temos a compreensão de que o imóvel rural deve cumprir este requisito legal, é fato que pouco se fala sobre o seu conceito. Por esta razão, resolvemos buscar o conceito de função social, para que possamos saber exatamente como o proprietário do imóvel rural deve proceder para afastar o risco de desapropriação.
Segundo a Lei 8.629/93, que dispõe sobre a reforma agrária, a função social acontece quando a propriedade rural atende a quatro critérios, quais sejam:
I – aproveitamento racional e adequado;
II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
A própria legislação citada explica o que significa cada um destes quatro requisitos, os quais passamos a analisar individualmente.
O primeiro requisto – aproveitamento racional e adequado – ocorre quando a propriedade tem Grau de Eficiência da Exploração (GEE) superior a 100% e Grau de Utilização da Terra (GUT) superior a 80%.
É de mais simplificada compreensão o GUT. Para cumprir a lei, pelo menos 80% da parte aproveitável do imóvel rural deve ser utilizado na atividade produtiva.
Já o GEE é calculado sobre os indicadores apresentados pelo INCRA, desta forma:
I – para os produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada produto pelos respectivos índices de rendimentos estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Micro região Homogênea;
II – para a exploração pecuária, divide-se o número total de Unidades Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Micro região Homogênea;
III – a soma dos resultados obtidos na forma dos incisos I e II do art. 6º e aqui transcritos, dividida pela área efetivamente utilizada e multiplicada por 100 determina o grau de eficiência na exploração.
Em síntese, a propriedade rural deve manter índices produtivos iguais ou acima dos indicadores do INCRA. Estes indicadores costumam ser apresentados na própria guia de recolhimento do ITR.
O segundo requisito dispõe sobre a utilização adequada dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente. Sobre a utilização adequada dos recursos naturais, a lei diz que esta ocorre quando a exploração se faz respeitando a vocação natural da terra, de modo a manter o potencial produtivo da propriedade.
Já a preservação do meio ambiente depende da manutenção das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, na medida adequada à manutenção do equilíbrio ecológico da propriedade e da saúde e qualidade de vida das comunidades vizinhas.
O terceiro requisito refere-se à observância das disposições relativas às relações de trabalho e, evidentemente, dizem respeito ao cumprimento das leis trabalhistas e dos contratos coletivos de trabalho, bem como das disposições que disciplinam os contratos de arrendamento e parceria rurais.
Por fim, o quarto requisito do cumprimento da função social, o favorecimento do bem-estar dos proprietários e trabalhadores, objetiva o atendimento das necessidades básicas dos que trabalham a terra, observa as normas de segurança do trabalho e não provoca conflitos e tensões sociais no imóvel.
Estes são os requisitos para o cumprimento da função social da propriedade e devem ser cumpridos para que o imóvel rural não seja objeto de uma desapropriação para fins de reforma agrária, o que pode acontecer com imóveis considerados improdutivos e que tenham mais de 15 módulos fiscais (para saber o que é módulo fiscal, clique aqui).
por Francisco Torma, advogado agrarista.
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