*por Francisco Torma
A Câmara dos Deputados deu um passo decisivo e fundamental para a sustentabilidade do agronegócio nacional com a aprovação do Projeto de Lei (PL) 5122/2023. O texto, que agora avança para a análise do Senado Federal, aloca recursos financeiros para instituir uma linha especial de financiamento para a quitação de débitos de produtores rurais. O objetivo principal é mitigar os impactos de eventos climáticos extremos e crises econômicas que têm assolado o setor produtivo nos últimos anos.
O projeto de lei autoriza a utilização de recursos do Fundo Social (FS) para a criação dessa linha de crédito. A expectativa é que a medida possa liberar até R$ 30 bilhões para socorrer produtores rurais endividados, permitindo o refinanciamento de dívidas e a recuperação da capacidade produtiva.
Entenda o alcance e as condições do refinanciamento
A linha especial de financiamento se destina a produtores rurais, suas associações, cooperativas de produção e condomínios. Para ter acesso, o produtor precisa atender a uma série de requisitos:
- Critérios Municipais: Os beneficiários devem estar localizados em municípios que atendam a pelo menos dois dos seguintes critérios:
- Haver declarado estado de calamidade pública ou situação de emergência, reconhecidos em nível federal ou estadual, em no mínimo dois anos entre 2020 e 2025, devido a eventos como alagamentos, estiagens, secas ou geadas.
- Apresentar um percentual de dívidas de crédito rural com atraso superior a 90 dias ou dívidas renegociadas que supere 10% do total da carteira de crédito rural do município em 30 de junho de 2025.
- Ter registrado, entre 2020 e 2025, pelo menos duas perdas de produção de no mínimo 20% do rendimento médio municipal de uma cultura ou atividade pecuária.
- Perdas de Produção: O produtor deve ter registrado perdas em duas ou mais safras, de no mínimo 30% da produção em pelo menos uma cultura, com comprovação por laudo técnico.
As dívidas que podem ser refinanciadas incluem:
- Parcelas vencidas ou vincendas de operações de crédito rural, contratadas até 30 de junho de 2025.
- Empréstimos de qualquer natureza utilizados para liquidar operações de crédito rural ou Cédulas de Produto Rural (CPRs).
- CPRs vencidas ou vincendas, emitidas até 30 de junho de 2025, em favor de instituições financeiras, cooperativas, fornecedores de insumos ou compradores da produção, desde que registradas em entidade autorizada pelo Banco Central.
A proposta estabelece condições financeiras atrativas, como juros anuais diferenciados e prazos estendidos:
- Prazo de pagamento: 10 anos, com 3 anos de carência. Casos extraordinários podem ter o prazo estendido para até 15 anos, conforme regulamento posterior.
- Taxa de juros efetiva: Varia de acordo com o perfil do produtor:
- 3,5% ao ano: para beneficiários do Pronaf e demais pequenos produtores.
- 5,5% ao ano: para beneficiários do Pronamp e demais médios produtores.
- 7,5% ao ano: para os demais produtores.
Além disso, o projeto prevê a suspensão de cobranças administrativas, execuções extrajudiciais e judiciais, e a inscrição em cadastros negativos de crédito para as dívidas abrangidas pela lei até que os financiamentos sejam efetivados. Outro ponto importante é que a contratação dessa linha de crédito não impedirá a contratação de novas operações de crédito rural ou o registro do produtor em cadastros restritivos.
Caminho para se tornar lei
É crucial ressaltar que a aprovação na Câmara dos Deputados é apenas uma etapa do processo legislativo. O PL 5122/2023 agora precisa ser aprovado no Senado Federal e, posteriormente, ser sancionado pela Presidência da República para se converter em lei. A sanção presidencial autorizará a utilização dos recursos do Fundo Social.
Uma vez sancionada, a lei ainda dependerá de regulamentação para que as condições de acesso ao crédito sejam plenamente detalhadas. A efetivação dos financiamentos deverá ocorrer em até 6 meses após a publicação do regulamento.
Merece destaque, ainda, que o referido projeto não equivale ao projeto de securitização que tramita no Senado Federal. Embora o texto de ambos os projetos tenha iniciado igual – tratando da securitização, o projeto que tramita na Câmara dos Deputados teve texto substitutivo apresentado pelo deputado Afonso Hamm. Este novo texto não procura mais securitizar as dívidas, mas sim refinanciá-las.
A aprovação favorável do PL 5122/2023 é um importante marco na busca de um instrumento que visa a recuperação financeira dos produtores, a estabilidade da produção de alimentos e a manutenção do desenvolvimento econômico do país. A mobilização do setor para que o projeto continue avançando no Senado é fundamental para que esta pauta se concretize e gere o impacto positivo esperado para a agropecuária brasileira.

*Francisco Torma é advogado agrarista, especialista em direito tributário, especialista em Agronegócio pela ESALQ/USP, coordenador do portal AgroLei, Coordenador da Comissão Nacional de Crédito Rural e Financiamento do Agronegócio da UBAU, Coordenador da Comissão de Direito Agrário e Agronegócio da OAB Ijuí, Coordenador do portal PreparaAgro, professor de direito agrário, palestrante, colunista e escritor. Co-fundador do projeto “Direito Agrário Levado a Sério“. Saiba mais clicando aqui.

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