por DANILO PADOVANI*
Não é de hoje que vemos animais em lavouras, mesmo em pastagens de propriedade do vizinho. Isso é corriqueiro por todo o país, mas sabe por quê? Não? Dizemos-te: falta de alimento onde o gado está apascentado.
Animal é irracional, ele (gado), por exemplo, não sabe onde começa e termina a propriedade de seu dono. O animal tem certa compreensão, mas lhe falta discernimento e com isso o dever de cuidado com o mesmo é de inteira responsabilidade do proprietário.
Se onde o gato estiver pastando estiver com pouco material alimentar, ele vai procurar outro lugar com mais vegetação para se alimentar, independente de qualquer tipo de cerca existir na divida de propriedade. Irá estourar a cerca e passar, pois isso o dever de manter seu rebanho dentro da sua propriedade é do seu dono.
Para tanto o art. 936 do CC/02 diz que: “O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior”
E no PL 4/2025 o atual art. 936 passa a ser o “art. 936 A”; ficando a redação do art. 936 da seguinte forma:
“O proprietário, o guardião ou o detentor do animal será responsável, independentemente de culpa, pelo dano por esse causado, salvo se provar fato exclusivo da vítima, de terceiro, caso fortuito ou força maior.”
Há mudanças significativas, mas o essencial é a responsabilidade objetiva além de aumentar os responsáveis.
Pronto, aqui começa toda a confusão, o animal por ser irracional age pelo instinto de sobrevivência, e sai a procura de alimento com fartura arrebentando cerca, pulando cerca, para se alimentar, onde está a culpa da vítima? Alegar força maior neste caso seria colocar a culpa em São Pedro por não mandar chuva suficiente para rebrota do pasto?
Penso que não, para as duas perguntas, há prejuízo causado a terceiro que não deu motivo algum ao dano.
O pecuarista que tem pouca extensão de pastagem que diminua seu rebanho para a quantidade exata de área que possui, e não deixar extensivamente seu rebanho em condições degradantes. Pois a Embrapa calcula a rotação em 36 dias, com pastagem irrigada, a quantidade de 7 a 10 cabeças adultas por hectares[1]. Agora em pastagens sem correção de solo adequado, sem descanso o número tende a diminuir para 5 a 8 hectare.
Acredito ainda que nessas condições o dono poderá responder por crime de maus tratos aos animais (art. 32 da Lei 9.605/98), por deixá-los com pouco alimento disponível. Também pode responder pelo crime de danos (art. 163 do CP). A falta de pastagens adequadas para alimentar o gado decorre por degradação das pastagens e do solo e o MPMG vem atuando para combater essa degradação utilizando do Sistema de Apoio no Diagnostico de Pastagens Degradadas (sipade), variando as multas entre R$ 5.000,00 a R$ 50.000.000.00.
Mas a princípio é deixar claro a responsabilidade civil por invasão da propriedade e danos em pastagens vedadas e em lavouras. Que é o corriqueiro por todos os lugares deste vasto país.
A jurisprudência do TJMG é firme ao entender que a responsabilidade trazida pelo CC/02, em seu art. 936 é objetiva, ou seja, independe de culpa do dono/detentor do gado.[2] Não destoa o entendimento do TJSP neste mesmo sentido.[3]
Portanto, havendo invasão do gado por rompimento de cerca, ou por terem os animais pulado a cerca, e dano na lavoura latente o dever de indenizar. O Dano pode ser o pisoteio, pastagem da guia da planta por exemplo.
Mas caso em uma ação o dono do gado alegue “ah mais sua cerca estava ruin”, como autor solicite uma inspeção judicial para demonstrar que o réu tenha muito gado apascentado e pouco capim para o gado, tudo muda de figura restando claro que o pecuarista deu causa ao rompimento da cerca, mesmo ela estando ruin.
Como dito alhures a responsabilidade é objetiva, se falta o que comer para o gado, instintivamente o gado sai à procura e nada segura a criação faminta, então por ser irracional, o seu dono/detentor tem o dever de reparar pelos danos causados.

*Danilo Padovani, advogado, pós-graduando em Advocacia para o Agronegócio, Especialista em Direito Público, MBA em Controladoria, Auditoria, Finanças e Planejamento Tributário, produtor rural.
[1] https://www.embrapa.br/en/busca-de-noticias/-/noticia/17940375/pesquisadores-desenvolvem-sistema-para-criacao-de-bovinos-em-condicoes-irrigadas
[2] “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. INVASÃO DE GADO. DESTRUIÇÃO DA PLANTAÇÃO E DO SISTEMA DE IRRIGAÇÃO. PREJUÍZO PARA A SUBSISTÊNCIA DO AUTOR. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. QUANTUM. CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Para que haja o dever de indenizar, é necessária a conjugação da conduta, do dano e do nexo de causalidade entre ambos. 2. Comprovada a invasão da propriedade do autor pelo gado do réu, bem como os prejuízos causados, deve ser confirmada a sentença de procedência do pedido de indenização por dano moral. 3. De acordo com a corrente majoritária contemporânea, a quantificação do dano moral se submete à equidade do magistrado, o qual arbitrará o valor da indenização com base em critérios razoavelmente objetivos, analisados caso a caso, tais como a gravidade do fato em si e suas consequências para a vítima, a culpabilidade do agente, a possível culpa concorrente do ofendido, a condição econômica do ofensor, as condições pessoais da vítima etc., devendo observar também os patamares adotados pelo Tribunal e pelo Superior Tribunal de Justiça.” (Apelação Cível nº 1.0000.21.213118-9/001 – Relator: Des. Marcos Lincoln – Julgamento em 24/11/2021 – publicação da súmula em 24/11/2021).
“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. IMÓVEIS FRONTEIRIÇOS. INVASÃO DA PROPRIEDADE RURAL DO AUTOR POR ANIMAIS DO VIZINHO. DESTRUIÇÃO DE AGRICULTURA DE SUBSISTÊNCIA. COMPROVAÇÃO. DANOS MORAIS. CONFIGURAÇÃO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. I – O instituto da responsabilidade civil prevê, claramente, a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiro, em virtude da prática de um ato ilícito (art. 186 do Código Civil). II – Nos termos do art. 936, do CC/02, é objetiva a responsabilidade do proprietário do animal, pelos danos causados a terceiro, salvo se ficar comprovado a culpa da vítima ou força maior. III – Comprovado que os animais de propriedade da parte ré invadiram o imóvel rural da parte autora e destruíram a sua agricultura, cuja exploração visa a sua mantença e de sua família, tem-se por caracterizada a ofensa moral e o dever de indenizar. IV – Na fixação de indenização por dano moral, o julgador deve levar em conta o caráter reparatório e pedagógico da condenação, de forma a não permitir o lucro fácil do ofendido, mas também sem reduzir a verba a um valor ínfimo ou irrisório, sempre atento aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e das diretrizes do art. 944 do Código Civil. V – Verificado que o quantum indenizatório arbitrado em primeiro grau é excessivo e não se harmoniza com a extensão dos danos morais infligidos à pessoa ofendida, impõe-se a sua redução em conformidade com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. VI – Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJMG – Apelação Cível 1.0000.23.090523-4/001, Relator(a): Des.(a) Vicente de Oliveira Silva , 20ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 16/08/2023, publicação da súmula em 17/08/2023)”
[3] “DIREITO DE VIZINHANÇA Danos causados em plantação, em decorrência de invasão de animais Plantação danificada Responsabilidade do proprietário dos bois Exegese do artigo 936 do Código Civil Responsabilidade do dono dos animais Dever de indenizar Ausência de causas excludentes da responsabilidade (caso fortuito, força maior e culpa exclusiva da vítima) Danos materiais não comprovados Danos morais Ocorrência Indenização arbitrada pela r. sentença em R$ 10.000,00 Quantia reputada razoável e eficiente para ressarcir a autora, consideradas as condições das partes Pretensão de redução do montante afastada Sentença mantida – Recurso não provido.” (TJ/SP, Apelação Cível nº 1004866-06.2016.8.26.0024, 31ª Câmara de Direito Privado, j. em 26/10/2017).
“Ação de arrendamento rural – indenização por invasão de gado na plantação – caso concreto em que a inércia do arrendatário prejudicou a prova da extensão dos danos – condenação da arrendadora em danos morais – recursos providos em parte.” (TJSP – Apelação Cível nº 879.391-0/5 – 33ª Câmara de Direito Privado – Relator: Des. Eros Piceli – j. em 18/04/2007 – publicação em 27/04/2007).

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