Uma proposta do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) para a criação de duas novas Unidades de Conservação (UCs) na região das Missões, no Rio Grande do Sul, acendeu um alerta no setor produtivo e mobilizou o Congresso Nacional. O projeto abrange mais de 160 mil hectares e prevê restrições de uso do solo em cinco municípios, motivando um Requerimento de Informações no Senado Federal sobre a viabilidade econômica e a segurança jurídica dos produtores rurais locais.

O Projeto: APA e Refúgio de Vida Silvestre

A proposta do governo federal visa proteger remanescentes do Bioma Pampa, especificamente as formações de “parques de Pau-ferro” (Myracrodruon balansae), campos com barba-de-bode e vegetação rupestre. Segundo o ICMBio, o Pampa já perdeu 30% de sua vegetação nativa, com uma aceleração do desmatamento observada entre 2015 e 2024, restando apenas 3% do bioma protegido em UCs.

O plano prevê a criação de duas unidades sobrepostas e contíguas:

  1. Área de Proteção Ambiental (APA) Campos Missioneiros: Com cerca de 117 mil hectares, é uma categoria de uso sustentável que permite a permanência da população e visa compatibilizar a conservação com a agropecuária.
  2. Refúgio de Vida Silvestre (RVS) dos Campos Finos e Pau-ferral: Uma categoria mais restritiva (Proteção Integral), abrangendo cerca de 43 mil hectares. Embora permita a propriedade privada, o uso da terra deve ser compatível com os objetivos de preservação integral da biota. Caso haja incompatibilidade com atividades produtivas, a legislação prevê a desapropriação da área.

Os municípios afetados pela demarcação são Santiago, Bossoroca, Santo Antônio das Missões, Itacurubi e Unistalda. Em Itacurubi, por exemplo, a soma das áreas da APA e do RVS comprometeria 43,4% do território municipal.

Preocupação no Campo: Insegurança Jurídica e Econômica

A principal controvérsia reside na criação do Refúgio de Vida Silvestre (RVS). Documentos do ICMBio indicam que áreas privadas dentro do RVS podem ser desapropriadas se as atividades agropecuárias forem consideradas incompatíveis com a proteção integral da natureza.

No entanto, o processo atual não apresenta estimativas de custos para essas indenizações, nem um cronograma financeiro claro, o que gera temor entre os produtores rurais sobre possíveis perdas patrimoniais sem a devida compensação. Além disso, não foram divulgados estudos de impacto econômico detalhados sobre como essas restrições afetarão a arrecadação municipal, o emprego e a dinâmica produtiva de uma região historicamente consolidada na pecuária extensiva.

A Reação do Senado

Diante da falta de clareza e do potencial impacto socioeconômico, o Senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) protocolou, em 24 de novembro de 2025, o Requerimento nº 868/2025, exigindo explicações formais à Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

No documento, o parlamentar questiona a condução do processo, alegando que o ICMBio avançou para a fase de consulta pública sem apresentar os estudos técnicos completos à população e às prefeituras, conforme exigido pela Portaria Conjunta MMA/ICMBio nº 1.145/2024.

Os principais pontos cobrados pelo Senado incluem:

  • Estudos de Impacto: A apresentação dos estudos sobre impactos no emprego, renda, atividade pecuária e arrecadação dos municípios.
  • Recursos para Indenizações: A confirmação se existe orçamento disponível para desapropriar terras no RVS e qual o custo estimado, visando evitar calotes ou insegurança jurídica.
  • Contexto de Calamidade: O requerimento destaca que o Rio Grande do Sul ainda se recupera de severas catástrofes climáticas e questiona a imposição de novas restrições produtivas neste momento de reconstrução econômica.
  • Consulta aos Governos Locais: O senador solicita provas de que a Casa Civil do Governo do Estado do RS foi formalmente consultada, uma etapa obrigatória que, segundo o requerimento, pode não ter sido cumprida.

Próximos Passos

O processo administrativo do ICMBio encontra-se na transição da “Etapa Analítica” para a “Etapa Consultiva”. As próximas fases envolvem reuniões setoriais e consultas públicas antes do envio da proposta final ao Ministério do Meio Ambiente.

O Ministério do Meio Ambiente tem o dever constitucional de responder aos questionamentos do Senado, esclarecendo se haverá programas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) para os produtores afetados e como pretende garantir que a criação das reservas não inviabilize a economia local.

O AgroLei.com seguirá acompanhando os desdobramentos deste processo e a resposta oficial do Governo Federal.


Veja na íntegra o projeto apresentado pelo ICMBio, incluindo os mapas das possíveis unidades de conservação.


Redação AgroLei.com

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